Todo o primeiro terço do filme, por exemplo, é composto de sequências de ação para lá de exageradas. De nenhum modo isso seria um ponto fraco em um filme como esse, mas falta muita cadência à montagem, com a sensação de que cada uma das cenas é muito “seca” e sem propósito em relação ao todo. A câmera “nervosa” – que corta, balança e se movimenta a todo momento para tentar valorizar as trocas de sopapos –, a trilha sonora ligada no 220v constantemente e os frequentes jump scares não ajudam muito nessa introdução.
Se tudo é épico, nada é épico
A impressão é que o filme quer ser épico a cada segundo e acaba caindo naquela velha máxima de que, se tudo é épico, nada é épico. Se você já assistiu a produções como “Mad Max: Estrada da Fúria”, sabe como é importante haver um respiro entre as cenas de ação desenfreada para que o público consiga digerir o que foi mostrado antes de partir para a próxima luta, briga ou perseguição insana. Aqui, pelo contrário, só há silêncio quando o longa se prepara para aumentar o volume para dar um susto ou ampliar o impacto de uma situação.

Roteiro? Que roteiro?

O ponto mais baixo de “Resident Evil 6: O Capítulo Final” é o seu segundo ato, que sofre com uma inconsistência tremenda em praticamente todos os sentidos. Ao chegar aos arredores de Raccoon City e se reencontrar com Claire (Ali Larter), Alice embarca em uma subtrama completamente dispensável e que só serve como uma ferramenta bem artificial para prolongar a história e atrasar o cronograma apertado da personagem – que tem algumas poucas horas para salvar a humanidade.
Some a isso personagens novos que não empolgam – no nível “bucha de canhão” –, decisões bastante duvidosas por parte dos heróis e alguns mortos-vivos que parecem ter saído das piores sequências em computação gráfica de “Guerra Mundial Z” e você tem em mãos a receita para perder o fio da meada e, por consequência, o interesse do espectador. Além disso, o ritmo nesse ponto é ainda mais fraco que o da primeira parte, parecendo que a edição foi feita e refeita até render uma colcha de retalhos meio desconexa como em “Esquadrão Suicida”.
A trama segue em um ritmo bastante inconstante
Felizmente, na porção derradeira do filme, as coisas aceleram um pouco mais e a aventura ganha um fôlego que não demonstrava até então. Ok, algumas armadilhas manjadas à la “Jogos Mortais” pipocam aqui e ali, mas, no geral, o retorno à Colmeia deve derreter o coração de qualquer fã de longa data – tanto pelo cenário familiar quanto pelo fato de a trama voltar às suas origens. Adicionalmente, algumas boas tiradas, duas ou três cenas de impacto e uma luta final que traz sua própria dose de surpresas completam bem o pacote.
Resident Evil 6 sofre para manter as engrenagens em movimento
Com toda essa variação de qualidade em cada um dos atos, fica fácil perceber que “Resident Evil 6” sofre para manter as engrenagens em movimento. Embora os outros episódios da saga também recorram a um enredo raso para apresentar a aventura da vez de Alice, eles utilizam esse artifício de forma bem consciente e competente, fazendo com que o show de tiros e explosões flua divertidamente nas telonas – sim, isso vale mesmo para o quinto episódio da série, “Retribuição”, que ainda divide opiniões.
Na nova produção, o roteiro mal consegue fazer esse trabalho de forma satisfatória, o que indica problemas na trajetória de uma equipe já calejada na arte de produzir Resident Evils. Uma explicação para essa escorregada em um elemento básico do filme pode ser realmente o vazamento do script na web há alguns anos. Conferindo o produto final, dá para perceber que muito da trama estava no material vazado e que, provavelmente, fizeram mudanças de última hora para que eles não tivessem que voltar à estaca zero. Uma pena!

E mesmo assim, você vai assistir!

Pode parecer estranho, mas, mesmo com todos esses defeitos, “Resident Evil 6: O Capítulo Final” é um filme obrigatório para qualquer um que acompanhe há mais de uma década a franquia nos cinemas. Em uma indústria que ainda luta para conseguir emplacar bons filmes baseados em games, mesmo quando se trata de parcerias de grandes nomes de ambos os setores – vide os recentes “Warcraft” e “Assassin’s Creed” –, a série capitaneada por Paul W. S. Anderson chega ao seu sexto episódio colecionando bilheterias de dar inveja.
O roteirista e diretor percebeu cedo que a decisão de não se prender ao material original e a liberdade de poder criar a sua própria mitologia, em cima de uma nova personagem, foi essencial para o sucesso da saga – sempre com a inclusão de pitadas certeiras de elementos dos próprios jogos, claro. Com isso, fica muito, muito difícil não querer saber como tudo termina e colocar um ponto-final em uma daquelas histórias que são um guilty pleasure de muita gente por aí – no mesmo nível de produções como “Transformers” e “Velozes e Furiosos”.
Quem aí assistiu aos outros cinco filmes e vai deixar passar esse, hein?
A amarração final está longe de ser perfeita, ocorre meio que às pressas e dá uma forçada na barra em algumas das conclusões, porém não deixa de ser um descanso merecido para todos envolvidos no projeto: diretores, atores e público. Há até mesmo uma deixa para que, caso a produtora precise encher seus cofres com um tiro certeiro, uma sequência ou um reboot possam ser garantidos sem muita dificuldade. Afinal, estamos falando de Hollywood, não é mesmo?
Se partirmos do princípio de que até o game se reinventou depois de tanto tempo no mercado, não é de se estranhar que isso possa acontecer em sua contraparte hollywoodiana. Por falar nisso, Resident Evil VII: Biohazard também ganhou destaque no evento do longa-metragem. Além de a Capcom disponibilizar estações do jogo para que os visitantes o curtissem com o PlayStation VR, um trailer de RE7 exibido antes do filme mostrou que o clima tenso pode casar muito bem com a telona. Será que é o caminho para um novo começo? Não custa torcer.
No escurinho e em realidade virtual? Essa é a receita certa para sentir o clima de Resident Evil VII

Um adeus difícil

Por conta de todo o clima de despedida, fez falta uma presença mais massiva de personagens que marcaram a série nesse episódio derradeiro – principalmente pelo fato de boa parte deles ter dado as caras em “Resident Evil 5: Retribuição”. Ainda assim, não deixa de ser bacana ver Milla Jovovich encarnando Alice pela última vez, Ali Larter fazendo um bom trabalho na pele de Claire, Shawn Roberts sendo um Wesker ainda mais canastrão e Iain Glen se desdobrando para mostrar diferentes facetas do doutor Alexander Isaacs.
Uma grata surpresa na leva de novos artistas em “Resident Evil 6” – que são em sua maioria completamente esquecíveis – é a nova atriz-mirim a se tornar a Rainha Vermelha. A inteligência virtual maquiavélica já tinha mudado de rosto no capítulo anterior – trocando Michaela Dicker, do primeiro filme, por Megan Charpentier – e agora ganha um visual bem mais fofinho na interpretação de Ever Gabo Anderson, filha de Jovovich e Anderson. A mudança pode parecer gratuita de início, mas, por incrível que pareça, acaba se justificando.
Rostos novos e antigos fazem parte do último filme da série
No fim, “Resident Evil 6: O Capítulo Final” é um filme que, mesmo a trancos e barrancos, encerra uma franquia de sucesso nos cinemas e traz lampejos daquela aventura descerebrada que todo mundo odeia gostar – ou ama odiar. Ele está, sim, em um patamar abaixo dos capítulos anteriores, tem um roteiro praticamente inexistente e apresenta um ritmo sofrível, mas isso não deve impedir que ninguém encontre a sua diversão no longa.